A lição de Detroit

14 de agosto de 2013

A lição de Detroit

José Manuel Costa, presidente da GCI

Como as nações substituíram os impérios, também as cidades tomarão o lugar dos países. Esta visão regressou nas últimas semanas ao pensamento de vários especialistas em desenvolvimento urbano, à medida que as notícias davam conta do debacle, financeiro e social, de Detroit, uma das maiores cidades norte-americanas, hoje em ruínas: a cidade, que se ergueu devido à indústria automóvel, perdeu 80% das fábricas entre 1972 e 2007; e um quarto da população desde 2000.

Em Portugal, o tema passou um pouco ao lado das notícias – o Jornal de Negócios foi excepção, pelo que pude “apanhar” -, mas tenho de regressar a ele e enquadrá-lo na perspectiva de desenvolvimento urbano e todos os temas que lhe são transversais: a inovação, sustentabilidade, criatividade.

Detroit é hoje uma cidade terceiro-mundista. As luzes das ruas estão desligadas por falta de dinheiro; os serviços de emergência podem demorar uma hora a responder a um ataque cardíaco e, em caso de nevão, os cidadãos ficam impedidos, durante dias, de circularem de carro.

Há casas e edifícios abandonados, bairros inteiros em ruínas, subúrbios desolados. Basta uma pesquisa breve no Google para perceber a dimensão do problema. Há dias, o FT explicava que há alguns investimentos contracorrente no centro de Detroit, para tentar chamar mais pessoas à área core da cidade. Será, porém, um processo lento e altamente criticado – os bairros mais pobres, dos subúrbios, não verão um dólar de investimento.

Segundo alguns analistas, Detroit está a tentar seguir o exemplo de Pittsburgh, casa da indústria do aço norte-americana e que passou por um processo idêntico há umas décadas. A cidade investiu no seu centro e hoje cerca de 25% dos empregos encontram-se num raio de quatro a cinco quilómetros do centro. Para além de revitalizar uma zona nobre, este investimento poupou milhões de dólares de manutenção de serviços de emergência, que assim evitam andar quilómetros e quilómetros por dia.

Detroit, por exemplo, estende-se por centena e meia de quilómetros, gastando balúrdios em manutenção. Para voltar a sorrir, a cidade precisará de bem mais do que revitalizar o seu centro histórico, mas esta lição deverá ser aprendida, também, por cidades europeias – e portuguesas: em poucos anos, o sonho urbano transforma-se rapidamente em pesadelo. Há que criar condições para tornar as nossas cidades em centros de inovação, com menos manutenção, mais investimento em transportes públicos – veja-se, hoje, o que se passa nas maiores cidades brasileiras – e estratégias de sustentabilidade. Só assim as megacidades previstas para os próximos 30 anos serão habitáveis. Caso contrário, a explosão populacional criará cenários gritantes de insustentabilidade.

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