Ainda a sequela das campanhas do Pingo Doce e os comentários e efeitos em torno da sua actividade promocional. Sim, é verdade que a marca durante anos comunicou o statement “sem promoções, nem cartões, nem outras confusões”! Na altura, outras marcas combatiam essa estratégia com fortes e muito mobilizadoras ferramentas promocionais que, algumas vezes, deram confusão – “não há bela sem senão”…!
Acima de tudo o que as marcas procuravam era vender mais e satisfazer mais clientes, e para isso definiram posicionamentos distintos e diferenciados. Hoje vemos o Pingo Doce com promoções sem cartões mas com muita, muita confusão, pelo menos na primeira vez! Vítimas do sucesso, não tenho qualquer dúvida – porém imaginemos que a marca tinha feito tal campanha e o impacto tivesse sido nulo ou negligenciável – seria certamente bastante pior para a marca e para a sua gestão. É sempre assim quando as campanhas funcionam bem – causam ruptura com a operação normal das lojas, provocam desequilíbrios fortes na reposição dos stocks e, o maior impacto de todos, causam nos clientes uma tamanha surpresa e atracção que os levam a tomar atitudes, no mínimo, extraordinárias face à oferta proposta. Há claramente uma ruptura com a normalidade, uma mudança.
Os clientes do Pingo Doce deverão estar, neste momento, a alterar a forma de compra no seu “sítio do costume” – a aumentar compras nos dias de promoções e a reduzir nos restantes dias da semana e/ou do mês por efeito de canibalização. Dentro da cabeça dos clientes do Pingo Doce estará em curso uma outra mudança profunda – o planeamento das compras torna-se agora bem mais necessário; a atenção à comunicação e ao calendário e ciclos promocionais também; a contenção nos gastos diários na espectativa do aparecimento de uma grande promoção que permita alguns dias depois fazer uma melhor compra, passou a fazer parte do íntimo do cliente; porém, por outro lado, haverá também uma nova e, certamente, vasta franja de consumidores que passaram a colocar o Pingo Doce no seu radar de busca de promoções e que, até agora, poucas vezes tinham colocado a marca neste espectro da sua atenção.
A marca está a atacar territórios de concorrentes e a tentar buscar novos clientes. Depois de um “Big-bang” com a primeira promoção de desconto em toda a loja, seguem-se agora os descontos à secção…expectável – todo o talho, toda a peixaria, ao qual se seguirão certamente todas as frutas, todos os legumes, a padaria, os detergentes, as massas, os óleos, etc, etc, etc…
Na Direcção de Marketing do Pingo Doce passou a existir um calendário promocional, nunca como agora, tão condicionador das compras dos seus clientes. Estes vão reagir e condicionar as suas compras ao sabor das promoções – em suma, o Pingo Doce passou a dominar mais os seus clientes e espera, com isso, aumentar vendas aos seus já clientes e conquistar novos e assim ganhar vendas aos seus concorrentes.
Para que isto acontecesse de forma rápida e eficiente, a marca precisou de demonstrar aos clientes mas, principalmente, aos não-clientes que tinha mudado. Lançou uma espécie de uma bomba de neutrões, mas não pensava que o impacto negativo se voltasse tanto para dentro da marca e atingisse, com as suas ondas de choque, o “avião que lançou a bomba”.
Na minha opinião planeou mal o intangível da campanha, aquilo que vai para além da estratégia comercial pura e dura – faltou comunicação, faltou o suporte de discurso corporativo que sustentasse a inversão de posicionamento. Talvez tenha negligenciado os factores externos à marca e à empresa – a escolha do dia é muito infeliz pois aportou aos factores comerciais, os Político-Sociais estendendo o impacto a stakeholders que convém deixar à margem das campanhas comerciais; de um momento para o outro vimos Sindicatos, Partidos Políticos, Parceiros Sociais, Produtores, Fornecedores, para além de toda a população a envolver-se com o tema – “não havia necessidade”. A gestão que a empresa fez do assunto nos dias imediatos à campanha foi, no mínimo, insustentável e inverosímil para uma empresa desta dimensão. Ninguém podia acreditar que a marca estava a fazer uma promoção daquela dimensão por motivações puramente sociais e filantrópicas.
No rescaldo desta tormenta, e 1 mês passado sobre o lançamento da primeira pedra deste novo Pingo Doce, o que se pode concluir é que está em curso um ajustamento do mercado por via de uma mudança (uma grande mudança) de posicionamento do Pingo Doce. Críticas choveram, e ainda ecoam, sobre a incoerência da marca face ao seu passado! Mas será que há algum problema com as mudanças de posicionamento? Na minha opinião não.
A marca tem, agora, uma estratégia High-Low e muitas promoções e isso significa o quê – que está a evoluir e a adaptar-se à actualidade e aos clientes e necessidades de 2012! Significa também que o seu anterior modelo comercial e promocional se esgotou e que tinha que mudar para estancar as perdas.
Não o fez da melhor forma, não geriu a mudança da melhor maneira – é evidente que não – mas neste, como noutros negócios, estas são corridas de fundo. Há algum mal nisso? Não, de todo! Só os animais irracionais não aprendem com os erros, pelo que estou certo que hoje o Pingo Doce está muito mais ameaçador para os seus concorrentes do que no dia 30 de Abril; não obstante isto a marca precisa de mais Marketing e menos Comercial pois só assim poderá evitar as mesmas falhas do passado.
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