Quem controla o petróleo, controla as nações; quem controla os alimentos, controla as pessoas; quem controla o dinheiro controla o mundo. Recordamos aqui as palavras de Henry Kissinger porque elencam os mais importantes problemas actuais. Se às fontes energéticas, produção de alimentos para uma população em crescimento e dinheiro especulativo juntarmos a escassez de água, ficamos com uma destilação das principais aflições da humanidade.
A mais preocupante é a crise alimentar. As revoltas nas ruas lembram-nos os tumultos dos anos 80 e 90 nos países do hemisfério sul, contra as políticas económicas do Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI). Regressa a ameaça da fome massiva, que nos recorda o horror das imagens da subnutrição.
As razões são muitas e intricadas. Como explica a jornalista Sónia Lourenço, aos maus anos agrícolas e ao aumento do consumo nas economias emergentes asiáticas, provocado por uma população em crescimento e a aumentar o seu poder de compra, somam-se os efeitos da política de liberalização do comércio internacional de produtos agrícolas e do proteccionismo dos agricultores europeus e norte-americanos. E o problema é agravado pelo investimento no mercado de futuros de produtos agrícolas. Neste cenário, o uso de milho para produção de biocombustíveis, que fez aumentar o preço do cereal, evidenciou o facto, de fácil aproveitamento, de que nos Estados Unidos se enchem os depósitos dos automóveis com o alimento que saciaria muitas bocas.
Em épocas de crise, não há que hesitar: a ajuda alimentar deve ser prestada o mais rapidamente possível. Os famintos ainda se alimentam da utopia de programas alimentares mundiais, de Live Aids e outras iniciativas de pessoas e instituições que, apesar de saberem que muitos governos ditatoriais e corruptos desviam grande parte dos alimentos e enriquecem à custa do seu comércio especulativo, sentem que, do mal o menos, e que não podem assobiar para o ar enquanto outras pessoas morrem aos milhares pela mais indigente das causas.
A resolução do problema a longo prazo é mais complexa. O Banco Mundial e o FMI propõem-se incentivar a agricultura nos países africanos, através da duplicação dos empréstimos aos agricultores. Para Michel Chossudovsky, que assina o artigo “The global famine” no polémico site Global Research.ca, essa medicina não é solução, mas a causa do problema.
Não há remédios fáceis nem consensuais, porque as causas do problema são complexas. Mas qualquer análise do problema deve levar em conta que: 1) A fome sempre existiu, mas é nosso dever lutar no sentido da sua erradicação; 2) Pela primeira vez na história da humanidade, a agricultura tem condições tecnológicas para produzir alimentos em quantidade suficiente para toda a população; 3) Perante a fome, dê-se o peixe, mas logo que possível ensine-se a pescar; 4) Ao contrário do que se fez, precisamos de incentivar que os países do Terceiro Mundo produzam os seus produtos agrícolas, como alertou Koffi Anan, não os importando dos países desenvolvidos a preços baixos.
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