Pelos céus de Portugal

 

Estávamos nos arredores de Reguengos, perto de 30ºC, quando após algumas verificações técnicas a equipa Belga liderada por Jean Philippe escolheu o local para a largada. A bordo lá estávamos nós.

 

A caminho e sem aparente motivo, as questões iam surgindo: “Será que isto é mesmo seguro?”, “Quantos anos de experiência é que eles devem ter?”, “Mas afinal onde é que isto vai aterrar?”

 

Sim, as dúvidas eram algumas, dissipadas no exacto momento em que me vejo a sobrevoar a bonita região de Reguengos e me deixo levar pelo entusiasmo dos meus companheiros de voo. Tudo corria bem até que me apercebo que é ali à frente – sabe-se lá onde é que estamos? – que decidimos aterrar.    

 

A escolha, perfeitamente aleatória, acabara de recair sobre uma extensa planície no meio do Alentejo. Com o sol a pôr-se e sem resgate à vista (leia-se: um jipe, com duas pessoas, equipadas de mapas, bússolas e GPS), era o cenário que acabava de marcar o meu baptismo de voo. Arrumar o balão, o cesto, os queimadores e as botijas de gás e encostar tudo à beira da estrada mais próxima – dizem os entendidos que junto à estrada são os melhores locais para aterrar. Primeiro apareceram as melgas, depois os sapos que teimavam em confraternizar em voz alta, o frio e a noite que continuava a cair.

 

Algum tempo depois, finalmente apareciam os nossos colegas, estavam perdidos e a razão era simples: tínhamos acabado de aterrar algures numa propriedade privada, que, por assim o ser, não constava no GPS.  

Ao final da noite encontramo-nos com mais elementos da equipa. Uns riram-se, outros chamaram-lhe praxe… certo é que não deixou de ter o seu “quê” de aventura.

 

Quem me conhece sabe que não tenho nenhum tipo de apetência por invadir propriedades alheias, muitos menos aterrar-lhes, literalmente, em cima do quintal. Certo é que no voo da manhã seguinte eu e o meu colega lá estávamos… no quintal de uma bonita casa branca, tipicamente alentejana, a aguardar pelo sempre esperado resgate, depois de um dos voos mais fantásticos que se pode fazer e de passarmos pelo recém “recuperado” Alqueva.

 

 

O impacto da Travessia

 

Penso que antes de realizar este trabalho nunca tinha visto nenhum balão de ar quente a cruzar os céus. Não me recordo dessa imagem e caso a tivesse visto alguma vez, certamente lembrar-me-ia.

 

Os balões fazem parte do imaginário de muita gente. Criam um universo diferente, idílico, quase que surreal. A partida para a 10ª Travessia de Portugal em Balão de Ar Quente foi dada no norte do país, naquela que se afirma como a aldeia mais antiga de Portugal, Ponte de Lima. Daí a aventura passou pelo Porto, Coimbra, Batalha, Alcobaça, Santarém, Reguengos de Monsaraz para terminar em Beja.

 

Ao longo dessa semana as condições meteorológicas mudaram, o espírito de aventura enraizou-se nos participantes mas o comportamento e reacção de quem assiste a este espectáculo primou pela uniformidade.

As crianças certamente vibram com a imagem, os adultos que se deixam levar, voltam a ser crianças. Buzinadelas em plena auto-estrada, veículos encostados nas bermas das estradas menos congestionadas, acenos de homens e mulheres, flashes de fotografias e gritos de crianças, muitos gritos a chamar a atenção de todos os balonistas. Até os próprios proprietários de terrenos mais sacrificados com as aterragens dos balões surgiam com um misto de curiosidade, simpatia, alegria até.

 

Não existe nenhuma prova como a portuguesa em todo o mundo. Na generalidade das competições, se assim as podemos chamar, os voos que se realizam ao longo de vários dias confinam-se a uma determinada região. A travessia não! Percorre o país, atravessa cidades e campos, rompe a monotonia do azul do céu.

 

A notoriedade de um evento como este é bastante elevada mas a prova e o desporto em si são pouco conhecidos no país, por isso apenas os mais curiosos, e aqueles que se cruzam com o “bando” de balões sentem realmente a atracção pela travessia.

 

Os participantes confirmam que as condições climáticas favoráveis para a prática do desporto no país, a hospitalidade da maioria dos portugueses e as diferentes paisagens que são sobrevoadas colocam o evento num patamar muito elevado e difícil de igualar.

 

Os balonistas voltam aos seus países com as recordações bem vivas e o desejo de regressar e o efeito de “passa a palavra” pode atrair mais gente. Gente diferente que procura coisas distintas àquelas que normalmente se oferecem aos turistas que nos visitam.