Leio sobre a feira das vaidades. Leio sobre a ilusão das transferências milionárias. Leio sobre o estado do mercado. Os dramas das votações. Leio e apenas me lembro de algo que se passou com um amigo.
Estávamos a falar depois de um tempo sem nos vermos, estava ele a deixar uma famosa agência da nossa praça.
Como é habito português, perguntei-lhe logo se estava farto de ser explorado, o famoso complexo do oprimido, ao que ele me respondeu: “explorado?? se alguém explorou aqui, fui eu. Bebi tudo o que podia beber, aprendi tudo o que podia aprender. Sim, estive três meses sem fins-de-semana, mas se alguém explorou fui eu”.
Essa resposta trocou-me as voltas e deixou-me a pensar.
Quando leio sobre os problemas de Cannes fico sempre perplexo porque nunca alguém escreveu que veio a Cannes para aprender. Claro, isso seria impensável, gente “crescida” aprender…
Mas Cannes é muito isso. Cannes é ver trabalho fabuloso concentrado num único lugar. É aprender o que de melhor se faz, é querer superar-se. É recarregar as baterias a acreditar que é possível fazer trabalho revolucionário.
Cannes é ter a sorte de ouvir algumas pessoas a falar em conferências e workshops que, por alguma associação de ideias que fazem, conceitos que apresentam, sensações que nos provocam, fazem-nos pensar de forma diferente.
Há humildade em Cannes. Há vontade de aprender. Há a necessidade de acreditar que, apesar de tudo, foi esta a profissão que escolhemos e que isso continua a dar-nos prazer.
Neste ano de crise estamos de parabéns. Ganhámos mais leões do que em qualquer ano anterior. Temos, até à data, uma vitória nos jovens criativos na categoria de imprensa.
Conseguimos, pelo esforço individual de alguns, distribuir um reel com o melhor trabalho feito em Portugal e promover uma acção chamada “Portuguese for a day” com o intuito de divulgar o nosso Pais.
Temos uma praia e desenvolvemos toda a acção Tuga beach para apoio à nossa delegação e um serviço de navette Nice/Cannes.
Já se contam pelos dedos os portugueses que pensam que Cannes é passear de forma altiva pela Croisette, ficar no Carlton e andar de festa em festa.
A nossa delegação fica em apartamentos ou hotéis mais modestos, vai a conferências e vem aprender. Se querem férias vão para as Maldivas.
PS: E porque a mudança das mentalidades tem de ser acompanhada por uma mudança de estrutura é com alegria que sabemos que a representação do festival de Cannes em Portugal também vai mudar.
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