«La crise? Quelle crise?» Era uma questão que abria um documentário do canal de TV francês TF1, que retratava o paradoxo de os media relatarem diariamente uma crise económica crescente, ao mesmo tempo que os consumidores apresentavam sinais de abundância e de conforto nunca antes experimentados na história recente. Inspirado nas reflexões do egípcio Samir Amin, professor universitário que viveu uma fase da sua vida em Paris, mais tarde Presidente do Fórum Mundial das Alternativas, o trabalho baseava-se na teoria da «dinâmica das crises». Estávamos em inícios da década de 90.
Mais de uma década depois, o tema da crise está de volta e em força. A questão volta a colocar-se, quando pensamos nas verdadeiras capacidades económicas das famílias e dos agentes económicos em geral. Afinal, de que crise falamos quando está generalizado o acesso a bens de conforto no lar, a electrodomésticos, a veículos, a telecomunicações, etc. Afinal, somos a sociedade da abundância, dos telemóveis, dos maiores tempos de consumo de televisão, da popularidade do micro ondas, do mais de um veículo automóvel por lar, do acesso democratizado ao crédito, do multibanco, dos cartões, da internet em banda larga.
Sucede que uma década depois, e apesar de vivermos num patamar de desenvolvimento globalmente acima, somos a sociedade em que as diferenças de poder de compra se acentuam, a população envelhece e está correlacionada com o aumento das dificuldades sociais num contexto em que a pobreza desperta mais a consciência colectiva. A sociedade cuja economia teima em crescer, que marca passo na valorização dos seus recursos e que não ganha competitividade.
Assusta-me pensar que estejamos perante um mercado maduro, como evidenciam as características enunciadas. E num mercado em que o crescimento é limitado e a crise aperta, desperta o paliativo da variável PREÇO na gestão do marketing-mix: os descontos nos hipermercados, as ofertas de seguro auto «low cost», as contas bancárias que pagam as contas domésticas, os talões que dão descontos de gasolina, os telemóveis que não exigem carregamentos obrigatórios e que oferecem mais chamadas. Numa análise não exaustiva, arrisco a constatar que mais de metade do esforço de comunicação actual está centrado na variável preço. É a rainha quando a imaginação não dá para mais e quando os mercados aparentam não dar espaço. Quando as marcas têm objectivos de crescimento e o mercado não cresce, disputam o mesmo mercado. Sinais de que a crise pode estar para durar e que as marcas estão a disputar um mercado limitado e pressionado. Salve as que diversificam os seus negócios, procuram sólidos factores de diferenciação, inovam e lançam-se em novos mercados. Essas reduzem o seu risco de crise… e de sobrevivência. Auto estimulam-se e vencem.
Afinal, «la crise est l’opportunité».
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