A minha relação com a política tem mudado ao longo dos tempos, como seguramente mudou para todos os que me estão a ler. Quando atingi a maioridade e pude votar, assisti com interesse aos debates políticos, à procura de reconhecer o discurso com o qual me identificava mais.
Anos depois, assisti com desilusão, aos atos teatrais sucessivos e repetitivos de: 1. promete antes da votação; 2. ganha as eleições; 3. ah afinal a situação é muito pior do que imaginava; e corta para 4. afinal não vamos cumprir uma única promessa.
Nos últimos anos, assisti com imensa pena, à apatia dos cidadãos, que se afastaram da política, por se sentirem totalmente alienados.
Hoje, mais imune e experiente, e com a lupa da minha visão profissional, assisto com perplexidade aos incríveis e sucessivos tiros no pé que têm sido dados por António Costa e o PS por um lado e Pedro Passos Coelho e o PSD pelo outro. Pergunto-me se não viram o que eu vi ao longo dos anos?
Numa primeira reação, poder-se-á dizer que sofrem de um problema de imagem, de comunicação. Talvez não tenham alguém suficientemente bom em marketing político, que os aconselhe.
Mas a verdade é que o problema que os partidos e os políticos em geral enfrentam não é um problema de comunicação. É antes um problema de produto. E grave.
É claro que isso não invalida o facto da comunicação política estar toda errada. Promete-se demais e sem capacidade para cumprir. Fala-se mal da concorrência a torto e a direito, sem qualquer respeito aos factos ou vergonha na cara. Fala-se hiperbolicamente bem de si próprio, por não haver mais ninguém que o faça. Esconde-se a informação inconveniente, por mais pertinente que seja para as escolhas do cidadão. Há uma preocupação enorme com o packaging e os sound bites, sem qualquer intenção que estes respeitem a substância. Se os partidos e os políticos fossem sujeitos ao código ético da publicidade de produtos e serviços, estavam tramados. Mas repito, o problema de fundo, não é um problema de comunicação. É um problema de produto. E é grave.
A questão reside no facto de existir um tremendo desajuste entre a procura e a oferta política. Os partidos vendem algo (políticos) que os cidadãos não querem. E são incompetentes a produzir aquilo que tem procura. Estamos perante um problema gravíssimo no desenho do produto “o político”.
“O político” é, como hoje está à vista de todos, um produto que é desenhado com demasiado poder para tomar decisões (4 anos para tomar decisões sem consulta aos cidadãos que representam), decisões essas que são tomadas em função dos interesses dos accionistas dos partidos – que não são os cidadãos mas sim, os seus financiadores. Financiadores esses que têm agendas obscuras e em tantas ocasiões, opostas aos interesses dos cidadãos em geral. E como quem paga é quem controla o desenho do produto, é natural que assistamos a um total desfasamento entre das nossas vontades, opiniões e interesses e as decisões que os políticos tomam.
A situação não vai mudar enquanto mantivermos as mesmas regras de base. Tal como nas empresas, é preciso trazer inovação disruptiva também para a vida política. E essa inovação começa por duas mudanças estruturais:
1- Mudar radicalmente a forma como os partidos são financiados, passando esse financiamento a ser ditado pela vontade de cada um – por exemplo, na entrega da declaração de IRS, cada um indicar para que partido vai a sua quota parte do financiamento.
2- Criar mecanismos oficiais que permitam a cada cidadão votar com efeitos vinculativos nas medidas que queremos ver tomadas em relação a qualquer tema que nos suscita particular interesse e necessidade de envolvimento (ver esta TED talk inspiradora) .
Enquanto não fizermos estas mudanças, na minha modesta opinião, vamos continuar a ter os políticos que não queremos.
E nestas circunstâncias, não há marketing político que os safe.
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