A Máquina

13 de dezembro de 2016

A Máquina

Uriel Oliveira, diretor de operações e negócio da Cision

A subalternização da espécie humana e o domínio do mundo pelas máquinas é um tema há muito explorado pela indústria cinematográfica.

Apesar de não acreditar que esteja em risco tal domínio, muito menos subalternização, temo que a espécie humana não esteja, ainda, preparada para viver num mundo de máquinas inteligentes.

A inteligência artificial é, atualmente, tudo menos ficção, é uma certeza absoluta – Através de algoritmos interativos que analisam dados, a máquina aprende e com base nessa aprendizagem consegue desenvolver processos de decisão autónomos, capazes de substituir o cérebro humano.

Os grandes players da indústria das tecnologias de informação, Microsoft, Google, Facebook, Amazon, IBM, estão a apostar tudo no desenvolvimento de um super algoritmo que permita dar resposta a problemas tão díspares como a cura do cancro, a condução de viaturas, a deteção de fraudes ou a gestão de informação, e que os colocará no topo da ordem mundial das próximas décadas.

No marketing, o machine learning já é a chave para a interação entre marcas e consumidores. Com base na análise de dados, é possível relacionar e interagir em tempo real, em função do conhecimento detalhado de cada consumidor.

Os dados são o ouro do século XXI: demographics (informação sobre o sexo, idade, rendimentos, estado civil), psicographics (hábitos de compra, gostos, hobbies, interesses), toda a informação é preciosa e recolhida minuciosamente – quanto maior o conhecimento sobre cada indivíduo maior o seu valor.

A customização da informação ao perfil de cada pessoa é uma das utilizações mais visíveis e marcantes do machine learning na sociedade de hoje.

Mais de dois terços das audiências dos órgãos de comunicação social vem das redes sociais, sobretudo do Facebook, onde as notícias são mostradas a cada utilizador em função da análise do seu perfil de consumo de informação.

O algoritmo do Facebook reage em função dos hábitos, interesses e preferências de cada pessoa.

Assim, os órgãos de comunicação social ao distribuírem as suas notícias no Facebook estão a sujeitá-las ao livre arbítrio de uma máquina que as vai mostrar aos seus utilizadores em função dos seus perfis de consumo de informação. Isto quer dizer que se eu abrir sobretudo notícias sobre o Benfica, serão notícias sobre o Benfica que me serão mostradas no meu feed futuramente.

Só há uma forma de manipular o comportamento do algoritmo do Facebook, investindo em reach pago. Neste caso é possível decidir qual o público-alvo de cada informação. Mas como os órgãos de comunicação social não pagam para publicar as notícias no Facebook, as notícias que vimos no news feed são as notícias que a máquina pensa que nos interessam, em função das nossas escolhas.

O que por um lado parece ser uma grande comodidade, por outro lado, representa um risco enorme para a democracia conforme a conhecemos. A seleção de histórias pode facilmente omitir temas fraturantes, a pluralidade de ideias, opiniões, pontos de vista, fundamentais para formar uma opinião pública esclarecida.

Apesar de vivermos em liberdade e o acesso à informação ser livre para todos, é certo que a grande maioria consome a informação que lhe é dada a ver no seu Facebook, ou seja, a maioria vive voluntariamente, em sentido figurado, com umas enormes palas digitais nos olhos.

O poder da agenda mediática é agora uma máquina que nos representa no processo de seleção das histórias que queremos ver e das histórias que não queremos ver. O poder que é nosso e ao mesmo tempo não é.

Num futuro mais próximo do que conseguimos imaginar hoje, o mundo será muito diferente, a máquina irá substituir empregos que são hoje ocupados por quadros médios e superiores e provocar uma autêntica revolução social. O progresso tecnológico está a ser muito rápido e o impacto será brutal, na medida em que não existe uma preparação estrutural, sociológica, política, cultural, que nos permita viver neste mundo novo. Nos países mais evoluídos fala-se numa possível comparticipação do estado nos rendimentos das famílias como a forma de subsistência do futuro, mas será esta forma compatível com a própria natureza humana?

O tema do machine learning é um tema a que voltarei certamente nestas crónicas, dada a importância e influência que tem nas nossas vidas.

Hoje levantei-me cedo e fui comprar o jornal. À noite sentei-me no sofá às 20.00 em ponto para ver o noticiário.

Decidi que estava disponível para ver o que o mundo tinha para me mostrar, respirei fundo e senti o velho sabor a liberdade.

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Por Uriel Oliveira

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