O “despovoamento” ou, o mais comumente designado fenómeno da “desertificação” (designação enganosa, dado que nem de sinónimos se trata) é um dos flagelos que afeta o nosso país, mas também grande parte dos países por todo o mundo. E Portugal não foge “à regra”. Dados de 2011 relativos à Densidade Populacional por NUTS III, apontam no sentido de que as zonas costeiras (à exceção do Alentejo) tendem a, de forma quase homogénea, reunir mais habitantes por km2 (+ de 110), enquanto algumas zonas do interior apresentam registos de apenas 15 a 20 habitantes por Km2.
A 02.08.15 o Público publicou uma reportagem sobre a forma como um mundo rural moderno se estaria a desenvolver-se em Auvergne, na França, com a criação de uma agência regional com o objetivo último de atrair novos residentes e fazer deles os agentes principais do desenvolvimento local. Pretendia-se com isto, encontrar solução para o esvaziamento das aldeias, o seu envelhecimento abrupto, e o desaparecimento do mundo rural. O desafio era um: reunir uma série de peritos de áreas diversas para que desenvolvessem programas para atrair pessoas, estruturar ofertas, formar e monitorizar agentes territoriais.
Desde marketing territorial (do “como é bom viver no campo”), aos life coachers (nativos que acompanham a instalação de novos habitantes), a campanhas provocatórias, tudo foi pensado para incentivar, desafiar e motivar as pessoas a instalarem-se nesta região. Sem nunca esquecer um conjunto de fatores primordiais: atrair negócio (assente em estudos de mercado), mão-de-obra especializada (adaptada às necessidades reais), e condições que garantam a tão almejada qualidade de vida.
Também aqui, em Portugal, e em particular na Região Centro, encontram-se exemplo notáveis de projetos que procuram contrariar esta realidade, alguns deles apresentados na última edição do “Vê Portugal – Fórum Turismo Interno”, que se realizou em Coimbra nos dias 23 e 24 de junho, num painel a que chamamos de ”Potencialidades materiais e imateriais dos territórios – diferenciar, cooperar e empreender”. Trata-se de exemplos de projetos de sucesso, explicados pela sua qualidade, espírito integrador, empreendedorismo, trabalho em rede e envolvimento das populações, e que inspiram pelos resultados obtidos.
O projeto das “Aldeias Históricas de Portugal”, que envolve 12 aldeias e 10 municípios, e que integra 3 capitais de distrito: Castelo Branco, Guarda e Coimbra, atua em dois eixos basilares: Turismo e Sistemas Produtores e Inovadores Locais. A sua missão? Afirmar a Rede de Aldeias Históricas de Portugal como território sustentável e inovador assente no conceito de Crescimento Verde, reconhecido como um destino turístico de excelência e sustentado por recursos inimitáveis, com capacidade para potenciar o desenvolvimento local integrado, diferenciando-se como innovation leader no âmbito dos territórios de baixa densidade. A sua principal meta? Ser reconhecido como um destino turístico sustentável e Património da Humanidade da UNESCO, preservando e valorizando os recursos inimitáveis – o património / conjunto das aldeias e os saberes e atividades económicas associados; diferenciando-se como um destino turístico sustentável (crescimento económico em equilíbrio com o meio ambiente e garantindo a qualidade de vidas das atuais e futuras gerações) no contexto europeu; e como um território inovador, valorizando o conhecimento científico e empírico e aplicando-o aos recursos e setores tradicionais para criar novas dinâmicas e produtos diferenciados.
Também na Região Centro desenvolve-se o Projeto das Aldeias do Xisto, envolvendo 27 aldeias distribuídas num território de enorme beleza e com a capacidade de oferecer experiências únicas. Assume-se como um meio de promoção da renovação social, económica e ambiental, valorizando e mantendo a cultura, elemento ímpar e diferenciador. Assenta, por isso, em três grandes vertentes: Estratégica (posicionar as Aldeias do Xisto como marca dinâmica e contemporânea, coerente com os pressupostos da sustentabilidade ambiental, económica e social para promover o bem-estar pessoal e coletivo); Social (chamar novos atores para o território que participem no desenvolvimento económico e humano através de práticas contemporâneas, revitalizando tecnologias tradicionais e integrando-se no contexto social); Produto (criar novos bens e serviços que representem a cultura e a tradição das Aldeias do Xisto).
O território da Serra da Estrela e as suas aldeias, ainda que sendo uma das marcas mais notáveis de Portugal, sofre, de forma particular, de alguns dos problemas resultantes da baixa densidade e da falta de competitividade, num mundo cada vez mais globalizado. O projeto “Aldeias de Montanha” surge neste contexto, e é hoje dinamizado pela Associação de Desenvolvimento Integrado da Rede das Aldeias de Montanha (ADIRAM). A Rede de Aldeias de Montanha abrange territórios dos concelhos de Seia, Gouveia, Celorico da Beira, Guarda, Manteigas e Covilhã, localizados no limite do Parque Natural da Serra da Estrela, e ainda, os territórios dos concelhos adjacentes àqueles últimos com maior identificação simbólica com a Serra da Estrela, ou seja, Fornos de Algodres, Oliveira do Hospital e o Fundão na serra da Gardunha. Trata-se, portanto, de um projeto à escala supramunicipal, realidade importante no processo coletivo de construção identitária, mas também, pela necessidade de garantir a transparência e a equidade da gestão, perante todos os que integram o projeto. O seu principal desafio? Construir a marca Aldeias de Montanha na mente dos segmentos-alvo (nichos), posicionando-a num território da autenticidade e da genuinidade. Mas acima de tudo, captar a essência Aldeias de Montanha – através de um público que se liga ao destino por afinidade e pelo apelo emocional dos valores que lhe são intrínsecos.
Estes são apenas alguns dos bons exemplos de projetos que valorizam a “interioridade”, e contrariam o “despovoamento”, projetos que facilitam mudanças positivas e significativas nas diferentes comunidades. Isto faz-se envolvendo instituições públicas e privadas, comunidades inteiras, respeitando-se as naturais e desejadas diferenças de perspetiva, enaltecendo-se as “diferenças”, procurando-se uma visão comum, que abrace com orgulho o trabalho do “todo” integrador de todas as “partes”.
Tudo isto é gerador de uma enorme riqueza, económica, pedagógica, sociológica e cultural. E é com projetos desta natureza, integradores e conciliadores, que se promove a reestruturação e o equilíbrio nos territórios. E é desta forma, que se perpetua o “saber ser” e o “saber fazer”, a autenticidade de um povo e a sua identidade coletiva. E é também assim que se criam e consolidam algumas das marcas mais autênticas e genuínas do nosso país.
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