22 de janeiro de 2010

Mercados Lusófonos

Avanços


 


«Não pode haver senão vantagem num acordo e prejuízo num conflito»,
 André Gide


 


Começo agora a formular a ideia de que é possível (e desejável) um acordo político para viabilizar a aprovação do Orçamento de Estado para 2010. As negociações decorrem de forma dialogante entre partido do governo e oposição, e isso é uma boa notícia. Uma vez mais, fica claro que o Presidente da República desempenhou um papel fundamental, e marcou oportunamente a agenda. Num país cada vez mais citado internacionalmente quanto à provável derrapagem das contas públicas, logo após as dificuldades espelhadas pela Grécia, e onde, segundo especialistas, a dívida pública só conhecerá a possibilidade de descer abaixo dos 60% do PIB a partir de 2020, é fundamental o acordo para criar consensos em torno das principais questões com que nos debatemos em Portugal. As expectativas são altas: resistir à tentação das cedências político-partidárias que impliquem um aumento da despesa do Estado e, acima de tudo, ter discernimento para focar a discussão em torno do essencial, abre um potencial de um super-avanço na próxima semana. A ver vamos…



 


Entretanto, o Ministro da Presidência anunciou esta semana que o Fundo Monetário Internacional (FMI) elogiou o Governo português pelos resultados dos programas de modernização da administração central Simplex. Apesar de ser o próprio Governo a sublinhar esse reconhecimento, é bom que o tenha feito. Os bons resultados são estimulantes para potenciar novas iniciativas. Presumo que se trate de um avanço no domínio da eficiência do próprio Estado, pelo que é legítimo esperar que tenha, num prazo curto, impactos significativos na despesa da administração central: se sim, então é um avanço significativo. Agora, vale a pena saber quanto é que o Simplex poupou ao erário público e quantos postos de trabalho na função pública foram poupados no sentido de reduzir o excessivo peso do Estado enquanto empregador.



 


Recuos


 


«Se soubéssemos quantas e quantas vezes as nossas palavras são mal interpretadas, haveria muito mais silêncio neste mundo»,


Oscar Wilde


 


Uma ideia que pode funcionar, mas comunicada de forma péssima, pode prejudicar irreversivelmente a credibilidade do seu emissor. Trata-se de uma premissa da comunicação. E esta semana, registo um caso paradigmático de uma ideia, que pode funcionar, mas cuja infelicidade das palavras, leva ao ridículo: Lisboa como a «praia de Madrid»(!). António Mendonça, Ministro das Obras Públicas, aquando da sua visita à Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL), sublinhou a sua expectativa sobre a entrada em funcionamento da alta velocidade ferroviária (TGV), referindo que tal infra-estrutura colocará Portugal num “patamar superior” em termos de competitividade e atractividade. Embora discutível em termos de prioridades de investimento para o país, a oportunidade que pode abrir para o aumento de visitas de turistas espanhóis a Lisboa é um novo (e, porventura interessante) ângulo de visão sobre o TGV. No entanto, quando o Senhor Ministro concretiza dizendo que “Lisboa e toda a zona em redor será, provavelmente, a praia de Madrid”, e quando acrescenta, “por exemplo, onde é possível praticar novos desportos, como o surf…”, ficamos com a ideia clara de que esta saída foi ao sabor do momento, do entusiasmo pessoal, não resultando de uma reflexão bem estruturada de aproveitamento do potencial de desenvolvimento económico que o turismo pode representar para a região de Lisboa e para Portugal, decorrente do aproveitamento do TGV. O estudo da Deloitte sobre este tema até pode apontar interessantes oportunidades, mas importa cuidar da forma como se comunica. O registo soou a provinciano, e passa claramente à margem de uma melhor estruturada ideia do que se pretende na valorização da marca Portugal no exterior. Vale a pena o silêncio da reflexão antes do calor das palavras.



 


A figura de Soares dos Santos, presidente do grupo Jerónimo Martins, já nos foi habituando a sábias e doutas palavras. Temos o privilégio de (ainda) contar com empresários que sabem o que dizem, não porque é politicamente correcto, ou porque dá jeito à formulação de uma opinião, mas sim porque é a convicção resultante do que fazem no dia-a-dia das suas profissões. São os «fazedores» da economia real, empregadores dos portugueses e activos contribuintes para o desenvolvimento. Soares dos Santos fala verdade, porque fala o que sente, e sabe do que fala, pois carrega consigo uma experiência de trabalho de décadas. Na Câmara do Comércio e Indústria Luso-Alemã, referiu que “os portugueses estão constantemente a ser metralhados com mentiras sobre a situação económica do país”, e acrescentou a sua preocupação relativamente à crescente “interferência do Estado na economia”. O que pensarão os alemães sobre o estado da economia portuguesa e do clima empresarial português ao ouvir as palavras de Soares dos Santos?



 


Quadro Resumo – Semana 3







AVANÇOS 



. Vontade para a existência de um entendimento político sobre o OE 2010 (continuação)  



 


. Os elogios do FMI ao Simplex 


 


 







RECUOS



. Lisboa como a «estância balnear» dos madrilenos (de certeza que não é essa a ideia que o Ministro das Obras Públicas defende, mas foi isso que passou nas suas palavras ao referir-se aos benefícios do TGV)



 


. O sentimento dos empresários quanto à ausência de políticas pró-empresa potenciadoras da criação de emprego


 


 


 


Balanço da semana 3:


 


RECUO – apesar das divergências políticas e de ideias e visões diferentes sobre os mesmos problemas, vivemos no mesmo país, pelo que seria natural alinharmos por uma ideia de futuro, por um projecto, por uma estratégia mobilizadora. Esta semana é um pequeno exemplo do que falta percorrer nesta matéria. Será que na próxima semana iremos inverter este sentido?

Avalie este artigo 1 estrela2 estrelas3 estrelas4 estrelas5 estrelas
Loading ... Loading ...

Comentários (0)

Escreva o seu nome e email ou faça login com o Facebook para comentar.