Vamos fazer filhos?

9 de fevereiro de 2012

Vamos fazer filhos?

Mário Mandacaru, Brand Design/Brandia Central e Presidente do Clube de Criativos de Portugal

Num recente filme publicitário de uma certa marca alemã de automóveis que tem uma estrela por símbolo, um jovem casal repete as atitudes dos pais, certo de que está sendo arrojado e original.  Em trinta segundos fica resumida a teoria de Robin Skinner que no seu livro a meias com John Cleese “Famílias e como (Sobre)Viver com Elas” advoga que basicamente repetimos os atos dos nossos pais, ainda que procuremos muitas vezes agir de maneira diferente ou mesmo exatamente contrária.

Quer queiramos quer não, encontraremos nos nossos filhos características nossas, algumas pelas quais teremos orgulho de as ter transmitido e outras nem tanto. Lembro-me, por exemplo, de ter ficado entristecido quando foi diagnosticada a miopia do meu filho. É natural que seja assim, já nos basta termos que viver com as nossas imperfeições, vê-las replicadas é como bater no ceguinho…  ou, no míope neste caso.

Entretanto, o fato de até hoje não nos ter sido possível definir de antemão os aspetos determinantes dos nossos decendentes é o que nos garantiu continuarmos a existir enquanto espécie. Ninguém, mas ninguém mesmo, conseguiria fazer um briefing minimamente objetivo para a criação de um filho `custom made´. E se por algum acaso nos fosse possível, imagino o transtorno no balcão de reclamações, “desculpe, mas o pantone dos olhos não era esse”, “então esperei nove meses para que me entregassem um bebé que dá puns?!”.

Ou então poderíamos simplesmente abrir um concurso para que nos produzissem um filho `ideal´, com base em alguns parâmetros que definíssemos, e ficaríamos à espera de que alguma das vinte entidades concorrentes conseguisse realizar a proeza de nos apresentar aquilo o que estávamos à espera… ou no mínimo algo próximo disso.

É claro que uns estariam mais adequados a responder ao desafio do que outros, mas todos aqueles que nos conhecessem melhor e com quem já tivéssemos alguma proximidade teriam uma maior chance de acertar na empreitada. Por outro lado, correriam sempre o risco de nos apresentarem uma `criatura´ menos surpreendente, pelo fato de já estarem habituados às nossas vontades. A não ser que tenhamos especificado que “desta vez queremos algo novo, diferente dos loirinhos de olhos azuis… mas morenos não, ok?”.

Para os que não tiveram a oportunidade de privar com os solicitadores, restará realizar o melhor trabalho de casa, procurando informarem-se sobre o perfil dos requerentes junto aos mesmos e não só. Devem ir ao bairro onde vivem, perguntar aos vizinhos, ao homem do talho, à senhora da mercearia, que tipo de gente é essa e como imagina que seria o filho ideal para ela.

E não nos devemos esquecer que além dos aspetos físicos haveria sempre a questão do caráter, da personalidade da criança. “Queremos que seja afável, mas não apática; lutadora e ambiciosa, sem ser agressiva nem desumana; bem humorada e séria mas sem ser pateta nem chata.” Claro que no que toca ao desenvolvimento do perfil comportamental a responsabilidade é dos pais, ainda que possam solicitar externamente a `manutenção´ da cria.

O que é certo é que para que o resultado de um briefing desse calibre seja bem sucedido, resultará em filhos semelhantes aos pais, tal como acontece naturalmente, pois a vontade de perpetuação dos seus valores profundos deve suplantar os vipes e as modas ou não serão genuínos. Os solicitadores têm de ter a consciência daquilo que são e do que pretendem realmente, tanto quanto quem lhes presta o serviço.

Quer queiramos, quer não, as empresas são aquilo o que os seus líderes fazem dela e é preciso saber interpretar muito bem o que isso significa para conseguirmos desenvolver projetos de marca e de comunicação que lhes sejam fiéis. O que eu quero dizer com isso é que a relação entre es empresas e as agências deve ser o mais próxima e transparente possível para que o trabalho que desenvolvemos ganhe os mais sólidos alicerces.

Concursos? Eventualmente sim, mas com pertinência e objetividade ou ainda teremos por aí montes de criancinhas esquisitas e abandonadas.

P.S. Cabe-me informar que, sem ter feito briefing ou concurso algum, tenho os melhores filhos que alguma vez pudesse imaginar. De verdade.

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Comentários (3)

  1. 10

    por: luciana,
  2. Grande Mário! És como o Vinho do Porto, de boa cepa e com o passar do tempo, sempre a melhorar! Abs

    por: José Santos,

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