Entrevistas

30 de Novembro de 2007 em Entrevistas






B.I.
José Carlos Campos 

Profissão: Director criativo da campanha Super Bock.

Agência: Strat



 


Imagens de Marca: Quais foram os conceitos-chave da campanha?
José Carlos Campos:
No briefing que recebemos onde foi-nos dito claramente para sermos provocantes, brincarmos com os corpos e gerarmos algum efeito, para as pessoas comentarem. A campanha nasceu facilmente, apesar da dificuldade em fazer corpos humanos de copos e garrafas. Do trabalho criativo que produzimos, 80 por cento não vai para a rua, porque só sai o melhor.


 


IM: Porque é que esta campanha gerou tanta polémica?
JCC: Em Portugal, tudo o que envolva corpo, sexo, sensualidade corre o risco de estar envolvido em polémica, devido à cultura do próprio país. No entanto eu diria que foi uma polémica um pouco forçada, porque se gerou mais no território das agências de comunicação. Nós tivemos o cuidado de pré e pós-testar a campanha e, muito raras excepções, as pessoas gostavam da campanha. Isso para mim é o mais importante. Se o meu colega da agência ao lado não gostou, ou se um director-geral de uma empresa gostava muito de ter a Super Bock e utilizaram aqueles argumentos para denegrir a campanha, o tiro saiu-lhes completamente ao lado. Foi a grande campanha do Verão de 2006!


 


IM: E o que diz a quem o considera machista?
JCC:
Se machismo é gostar de mulheres, eu sou machista! O machismo é uma coisa mais dura, desrespeitosa e não é isso que está ali.


 


IM: É uma campanha mais ousada do que aquilo o que se vê por aí?
JCC:
A Super Bock é das marcas que, nos últimos anos, mais tem inovado em Portugal. No entanto, acho que é única marca que tem uma linha consistente de mupis há décadas. Sempre que mudamos, as pessoas pedem para voltar ao que já tínhamos feito.


 


IM: E isso é estimulante ou limitador?
JCC:
Acho que é um trabalho que tem os seus limites que se tornam estimulantes. Pode ser mais difícil ser criativo, mas não é limitador.


 


IM: Qual era o público dessa campanha?
JCC:
A Super Bock é uma marca mainstream, sobretudo no Verão, que é uma altura importantíssima para todas as cervejas. Não há um público muito específico. Temos de ter o cuidado para não cair numa linguagem muito jovem, nem do consumidor pesado de cerveja. Nesta altura do ano, os extremos tocam-se e nós, para comunicar, temos de ser abrangentes para toda a gente se rever na campanha e gostar dela.


 


IM: Que elementos são imprescindíveis para a comunicação da Super Bock funcionar?
JCC:
Nos mupis, os elementos têm de estar relacionados com a localização onde são colocados ou com eventos. Na televisão há uma gama muito vasta e cada produto cumpre objectivos distintos, trabalhando para um todo. Poucas marcas têm uma teia de produtos tão complexa e são tão fortes.


 


IM: É mais interessante trabalhar com um duplo sentido?
JCC:
Há pouco tempo fui convidado pelo Centro de Linguística da Universidade de Lisboa para uma palestra. Estavam lá quatro intervenientes e eu fui representar a Super Bock. Porque os linguistas consideram que a Super Bock, ao longo da sua história, é uma referência para a língua portuguesa pela forma como a trabalha e brinca. Os duplos sentidos da Super Bock são vistos pelos linguistas como um grande exercício de linguística. É claro que quando estamos a criar não pensamos nisso, mas é estimulante e deixa-me muito feliz saber que essas pessoas reconhecem numa marca uma riqueza linguística brutal.


 


IM:Considera que a publicidade está a ser mais respeitada e vista como uma forma específica de comunicação pela sociedade? 
JCC:
Acho que as coisas estão a mudar muito e hoje os consumidores não consomem apenas publicidade, também a produzem. As pessoas têm muito mais poder e se o têm é porque a publicidade, nos últimos anos, se aproximou mais delas e elas gostam. O sucesso da sociedade de consumo deve-se muito à publicidade e às pessoas gostarem de ser seduzidas por ela. O que eu sinto é que as pessoas respeitam muito mais a publicidade do que algumas pessoas na área da comunicação, incluindo publicitários.


 


IM: São os publicitários que não estão a respeitar a publicidade? 
JCC:
Muitas vezes, quem trabalha nesta área tem uma dimensão errada da sua profissão e não tem a consciência de que esta actividade é desinteressante para o público. Não podemos olhar para uma marca e pensar que é a coisa mais importante da vida das pessoas. Hoje em dia, as pessoas sofrem tantos estímulos que qualquer publicidade tem de ter uma mais-valia criativa ou de marketing. Um maior respeito pela nossa profissão significa entendermos que existe um mercado, uma indústria e um território onde o valor mais importante são as ideias. E as ideias têm de ser pagas. A tendência é para pagar o menos possível pelas ideias e, enquanto não houver um respeito a 100 por cento pelas boas ideias, por parte de todos, o mercado vai estar sempre desprotegido e vulnerável.


 


IM: Acredita em algum tipo de limitação à publicidade?
JCC:
Tem de haver um órgão que regule minimamente a publicidade, para não cairmos no caos. Depois depende é da isenção de quem estiver a regular, mas essa é uma área que foge ao meu domínio. Na publicidade, como em qualquer actividade, tem de haver regras e ética.
No entanto, relativamente às restrições de que se fala, continuo a achar que existe algum fundamentalismo na publicidade. Há coisas que se fazem em canal aberto de televisão que eu diria que são mais graves que qualquer anúncio publicitário. Não gosto de fazer o papel de coitadinho, mas a publicidade é o alvo mais fácil de atacar. É claro que há coisas que têm de ser punidas e temos de estar sempre atentos a publicidades enganosas. Nessa matéria acho que a legislação tem de ser mais agressiva. Agora, há casos em que a legislação em discussão é extremista. Quando o Estado quer actuar como o paizinho e o grande educador, não concordo. Temos de encontrar um equilíbrio.


 


IM: Quando é que estamos perante má publicidade?
JCC:
Todos os dias!
Mas a publicidade boa é uma coisa discutível, depende dos objectivos que se põe em cima dela e a liberdade para que ela flua. Porque a comunicação é uma coisa que flui. E uma teoria que tenho e é partilhada por mais gente é que essa base se tem vindo a perder. Fala-se muito em eficácia, que é muito importante, mas há um lado intuitivo que é necessário para se ter sucesso e isso desapareceu! Hoje toda a gente quer fazer uma campanha, tendo a certeza que no dia a seguir já está a vender não sei quantas caixas.


 


IM: Como caracteriza a publicidade e o público portugueses actualmente?
JCC:
O público português é muito diferente e muito melhor que as pessoas do mercado publicitário. O povo português é tudo menos conservador, esteve sempre aberto a novidades.


 


IM: E esse espírito não se reflecte no mercado publicitário? 
JC:
Acho que não. Hoje a publicidade dá às pessoas aquilo o que elas querem. Num canal de televisão eu até percebo, mas na comunicação publicitária acho mais discutível. Estamos a dar os embrulhos que as pessoas querem e não os embrulhos que as vão surpreender. Obviamente que olhamos lá para fora e percebemos que as pessoas estão a mudar, mas não tentamos estar à frente delas, tentamos só estar ao lado. E o ideal é, sempre que possível, estar um bocadinho à frente. Para surpreendermos as pessoas temos de fazer coisas de que elas não estão à espera. Não há sedução e a publicidade é sedução.





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